Embora o anteprojeto de revisão do marco regulatório das comunicações ainda não tenha vindo a público, algumas propostas vão se tornando mais claras nesse momento. Uma delas, que parece certa, é a intenção do governo Dilma de alterar o modelo de fiscalização da radiodifusão e das telecomunicações no país.
Uma das primeiras ações nesse sentido já aconteceu. O Ministério das Comunicações (Minicom) resolveu esta semana, por meio de um parecer jurídico, oficializar a responsabilidade de fiscalizar as empresas de TV e rádio para a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Antes, a Anatel detinha-se em atuar em questões técnicas, como a operação de rádios sem outorgas. Agora seus funcionários também terão que fiscalizar os desvios de conteúdo das emissoras, como a veiculação de publicidade nas programações acima do limite de 25% do tempo.
A consolidação formal desse convênio está sendo preparada pelo Minicom, mas o acordo já vale. O entendimento de ambas as partes é que a Anatel teria mais condições estruturais de fazer essa fiscalização. “Questões de conteúdo que já estão na lei estamos delegando à Anatel”, afirmou o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo em entrevista coletiva nesta quinta-feira (27). As punições às emissoras, previstas no Código Brasileiro de Telecomunicações, de 1962, serão feitas pelo Minicom.
Na prática esse acordo entre o Ministério e a agência reguladora existia há cinco anos. Só que, segundo Paulo Bernardo, ainda havia uma parte da regulação sob incumbência do Minicom. Muitas claramente não cumpridas, como a penalização de emissoras comerciais com outorgas vencidas há anos. “Havia um represamento de processos por causa de falta de pessoal”, admitiu o ministro.
Segundo Paulo Bernardo, a Anatel tem hoje uma estrutura de técnicos muito mais adequada para fazer esse trabalho do que o Ministério das Comunicações. “Nosso levantamento é que a gente tenha uns 150 técnicos que poderiam fazer esse trabalho”, contabilizou. No entanto, ele defende que esses funcionários sejam destinados a outras tarefas. As delegacias regionais do Minicom também passarão a cumprir outras funções.
Mesmo com esse novo convênio, que tende a aumentar o poder da Anatel, o modelo de regulação não está resolvido para o governo. Será aberta a discussão com o novo marco regulatório se deve ser criada uma nova agência para fiscalizar o setor. A discussão caminha para a sua criação. Seria um órgão que regularia a TV aberta, por assinatura e cinema. A Anatel poderia estar vinculada a essa agência. Já a responsabilidade do fomento à atividade de cinema e audiovisual continuaria na Agência Nacional de Cinema (Ancine), que é vinculada ao Ministério da Cultura.
Marco regulatório
O governo ainda trabalha para fechar uma posição sobre o marco regulatório. Depois disso, o ministro Paulo Bernardo afirmou que será feita uma consulta pública, ainda sem data para ter início, pela internet. Porém, audiências públicas presenciais não serão realizadas. Isso deve somente acontecer por iniciativa do Congresso, quando os parlamentares estiverem de posse do projeto.
O ministro já imagina que a construção de um novo marco legal para o setor não é algo rápido. “Se conduzirmos adequadamente o projeto, teremos um longo debate”. O Ministério ainda não sabe, por exemplo, se o melhor é tratar dos temas separadamente ou em conjunto, por um único projeto de lei.
Propriedade cruzada
Na coletiva desta quinta-feira, o ministro aproveitou para afirmar que não mudou sua posição contrária à possibilidade de uma mesma empresa obter concessões para vários meios de comunicação (propriedade cruzada). Segundo ele, não está aventada a possibilidade da criação de uma concessão única para empresas que operam veículos em distintos suportes. O que existe, segundo o ministro, é um estudo que está sendo feito pela Anatel para fornecer uma licença única na área de telecomunicações para vários serviços. No caso, telefonia, comunicação de dados (internet) e TV por assinatura, caso o PL 116/2010 seja aprovado.
Paulo Bernardo fez questão de frisar que trata-se apenas de uma ideia por enquanto. Não está certa e nem descartada. De qualquer forma é uma discussão que não passa pela revisão do marco regulatório. “É uma possibilidade. Vamos avaliar a conveniência”, disse. As concessões de radiodifusão estão fora desse estudo, ao contrário do que foi divulgado pelo jornal O Estado de São Paulo nesta quinta-feira (27).
O ministro já havia dito anteriormente que consta no projeto de marco regulatório mecanismos que inibem a propriedade cruzada. “De quando eu tomei posse até agora não mudou nada”, garantiu. No entanto, como esse assunto ainda não é consenso dentro do governo, a opinião de Paulo Bernardo não será necessariamente acatada.
Fonte: Observatório do Direito à Comunicação (Jacson Segundo).