Por Anderson Santos
Essa eleições foram marcadas por uma guerra declarada entre a chamada Grande Imprensa e o presidente Lula, com ataques recíprocos, que chegaram ao ponto de o Estadão declarar abertamente em editorial o seu posicionamento político-eleitoral - o que representa de certa forma até um avanço para a mídia nacional, que sempre busca se encobrir com o manto da “imparcialidade”.
No domingo passado (26) foi realizado o debate na TV Record com os candidatos à presidência da República, quer dizer, com os candidatos de partidos com representação no Congresso Nacional. Acompanhamos o debate com atenção especial, afinal na inserção que fazia a propaganda do trabalho da emissora durante as eleições, a jornalista Ana Paula Padrão se orgulhava de ter a liberdade para tratar assuntos que não seriam discutidos em outras TVs.
O segundo bloco foi marcado pelas perguntas das jornalistas da Record para as respostas e comentários de dois candidatos a serem escolhidos por quem arguia. Ana Paula Padrão, Adriana Araújo e Christiana Lemos se revezaram em perguntas sobre assuntos mais complicados para as campanhas dos candidatos. Uma em especial, a última, foi de fato a mais interessante.
Adriana Araújo perguntou ao candidato do PSol Plínio de Arruda Sampaio, com comentários a serem realizados por Dilma Rousseff (PT), se na opinião dele a imprensa estaria sendo imparcial, dadas as críticas à “cobertura eleitoral de alguns veículos de comunicação”.
Num gesto de interpretação nosso, conhecendo o histórico de trocas de acusação entre a emissora do bispo Edir Macedo com outros grandes grupos de comunicação, com destaque para as Organizações Globo e o grupo Folha da Manhã (gestor da Folha de São Paulo), a intenção era perguntar para os candidatos que tiveram problemas públicos com a "grande mídia” de forma a ter respostas que fossem críticas aos seus “arqui-inimigos”.
Talvez eles não esperassem que o tiro saísse pela culatra. Enquanto Dilma Rousseff fugiu de uma crítica real: “Considero que qualquer que seja o posicionamento de qualquer órgão de imprensa, ele tem todo o direito de falar o que quer a respeito da minha candidatura e eu tenho todo o direito de me defender quando achar que devo”. Mais uma prova de quão “silencioso” em termos de ações efetivas foi o Governo Lula contra o oligopólio de tais grupos e do quão pode ser um governo da candidata da coligação liderada por PT e PMDB.
Já Plínio respondeu a pergunta com argumentos que podemos chamar até mesmo de radicais: “Nós somos contra o sistema capitalista. E a grande imprensa, a grande mídia, é a grande arma do capitalismo. É por isso que é preciso ter controle social sobre os meios de comunicação massa. É preciso e isto não tem nada de censura”.
O fato marcante veio a seguir, com a réplica do candidato. Após criticar Dilma Rousseff pela sua trajetória política, Plínio voltou a apontar o posicionamento de omissão às “vozes dissonantes” nestas eleições: “Aquela proposta diferente, a proposta que questiona tudo, a proposta que questiona o sistema capitalista, esta proposta não tem lugar nos meios de comunicação”.
Quando ele terminou esta frase percebe-se no vídeo um problema na transmissão, que faz piscar o sinal, e a reação do candidato ao perceber que o relógio do estúdio apagou quando ainda faltavam vinte segundos das suas considerações.
O mediador Celso Freitas ficou sem saber muito que fazer e, às pressas, fez questão de dizer ao candidato que ele ainda tinha tempo para concluir o raciocínio. Tarde demais para evitar a reação de Plínio: “Bem, você vê como que é a imprensa, eu falei mal da imprensa e cortaram, olha aí. Olha aí. Eu falei mal, pá! Apagão”. Plínio foi aplaudido pelo público, enquanto Freitas ainda tentava dizer que o candidato tinha 20s.
Até não podemos dizer se o problema foi intencional ou não, mas foi bem expressivo o fato de ter ocorrido justamente no momento em que o candidato fazia uma crítica geral aos meios de comunicação de massa, e críticas até mesmo em direção à base da importância social deles para o atual sistema socioeconômico.
Mais expressivo ainda foi o fato de não encontrarmos nenhum texto sobre este acontecimento em qualquer lugar, sequer na Internet. Mais uma omissão que seria sem sentido se não prestássemos atenção ao ponto abordado no parágrafo acima.
Vale a pena questionar aqui também o candidato pela ausência no único espaço aberto para os candidatos que se assumem enquanto esquerda - encontro realizado pela Revista Carta Capital na terça-feira anterior ao debate da Record. Logo ele que aqui soube atacar tão bem a imprensa que tem a função de defender os interesses do capitalismo.
Quanto à Record, prefiro ficar com um trecho do livro A melhor TV do mundo, escrito por Laurindo Leal Filho (1997), em que o autor traz a preocupação dos gestores do broadcasting britânico durante o processo de quebra do monopólio estatal: “o argumento do estímulo à concorrência e pluralidade de programações era contra-argumentado com o fato de que, muitas vezes, em vez de uma ampliação das possibilidades de escolha para o telespectador, o que ocorria era apenas uma duplicação dos mesmos tipos de programa”.
(Veja abaixo a versão completa deste trecho do debate ocorrido no dia 26 de setembro).
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