A Audiência Pública que aconteceu em Brasília na sexta-feira (8), para discutir a proposta de revisão das diretrizes para o curso de jornalismo foi marcada pela divergência entre professores e profissionais de um lado e estudantes de outro. A primeira categoria, representada por entidades como a Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) e o Fórum Nacional de Professores de Jornalismo (FNPJ), defende a formação superior própria para a área. A segunda, organizada por meio da Executiva Nacional de Estudantes de Comunicação (Enecos), entende que dar autonomia ao curso de jornalismo cria uma fragmentação do saber, gerando um profissional menos qualificado.
O debate ocorreu em cima de uma proposta de novas diretrizes feita por uma comissão de especialistas formada pelo Ministério da Educação (MEC) no início de 2009. Esse grupo trabalhou em um documento e o entregou ao MEC em setembro deste ano. O Ministério, por sua vez, deu seu aval e passou a responsabilidade de aprovação das diretrizes ao Conselho Nacional de Educação (CNE). Essa foi a quarta audiência sobre o tema, que também já passou por uma consulta pública pela internet.
O documento elaborado pela comissão de especialistas e aprovado pelo MEC propõe claramente que devido às competências específicas que devem ser adquiridas para o exercício do jornalismo, ele deve ter uma formação superior própria. É o que algumas instituições de ensino superior já estão fazendo na prática. Se aprovada pelo Conselho de Educação, as diretrizes passam a valer para os novos cursos da área. No entanto, continua sendo permitida a oferta do jornalismo como uma habilitação dentro do curso de Comunicação Social.
A Enecos criticou tanto o conteúdo quanto o método de construção da proposta. Segundo a entidade, um curso de jornalismo autônomo pode restringir o aprendizado, a partir do momento que disciplinas de outros cursos e de outras habilitações da Comunicação poderiam diminuir na grade curricular. Com isso, segundo a Enecos, há o risco dos cursos ficarem muito técnicos.
“É a extinção do curso de Comunicação Social. É isso que está colocado”, afirmou Pedro Alves, um dos coordenadores da Enecos. Ele também acredita que o processo de construção das diretrizes foi pouco democrático e por isso defende que ele seja paralisado para que aconteçam mais debates sobre o assunto nas instituições de ensino superior do país.
Por sua vez, entidades profissionais e acadêmicas presentes na audiência elogiaram as diretrizes propostas. Elas entendem que o jornalismo já possui base científica e uma importância social que justificariam a autonomia do curso. “Não é dominando ferramentas publicitárias ou de cinema que o jornalista vai melhorar sua formação”, disse Edson Spenthof, do FNPJ. Além disso, foi reforçada a necessidade de melhorar a atuação dos profissionais que atuam no mercado jornalístico. “A profissão comunicador não existe”, completou Spenthof.
Embora a autonomia do curso de jornalismo tenha sido a maior polêmica da audiência, outras questões importantes apareceram. Alguns lembraram, por exemplo, da dificuldade que as instituições poderão encontrar para conseguir professores especializados em jornalismo, já que existem poucas pós-graduações específicas dessa área no país.
A proposta colocada para os Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs) também foi motivo de algumas críticas. No caso do TCC, as novas diretrizes propõem que ele deve ser constituído por um trabalho prático jornalístico, acompanhado por relatório memorial ou monografia. Essa obrigação em desenvolver um trabalho prático não agradou várias pessoas presentes na audiência.
Algumas entidades também reclamaram da falta de receptividade de suas propostas pela comissão de especialistas. Foi o caso da Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial do Distrito Federal (Cojira/DF). “Nosso documento não foi levado em conta”, criticou Juliana Nunes, da Conjira/DF. Em resumo, a proposta da organização é que o debate sobre as questões étnico-raciais seja introduzido na formação acadêmica dos jornalistas.
A proposta de novas diretrizes não tem data para ser discutida no Conselho de Educação. O ritmo de sua aprovação vai depender do grau de consenso sobre ela. A depender do entendimento dos membros do Conselho, novas audiências podem ser convocadas. Para o relator da proposta, Reynaldo Fernandes, o trabalho da comissão de especialistas construiu diretrizes bem amplas, diferentemente do que costuma ocorrer com cursos de outras áreas do conhecimento. Assim, se aprovadas dessa forma, os cursos de jornalismo teriam uma liberdade considerável para montarem suas grades curriculares.
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