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10 de outubro de 2010

EPC: "um programa de pesquisa geral para o campo da comunicação"

Por Rafael Cavalcanti e Anderson Santos


Publicamos hoje a última das entrevistas realizadas com professores que estudam a comunicação sob o sub-campo da Economia Política. O último entrevista é nada mais nada menos que o "fundador" dessa abordagem teórica, o professor e pesquisador da Universidade Federal de Sergipe, César Ricardo Siqueira Bolaño.

Com a publicação na década de 1980 do livro Mercado Brasileiro da Televisão, resultado da sua dissertação e Mestrado, César Bolaño "fundava" a Economia Política da Comunicação no Brasil, sendo um dos primeiros na América Latina, o que o situa na vanguarda internacional nos estudos comunicacionais.

Personagem importante tanto pela produção científica na área quanto pela capacidade de agregar pesquisadores, é um dos responsáveis pela criação de uma associação (União Latina de Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura/ULEP-ICC) e de um periódico científico internacional (Eptic). Preside duas instituições, ALAIC e ULEPICC, e o Conselho Deliberativo da Federação das Associações Científicas e Acadêmicas de Comunicação (SOCICOM).

Atual presidente da Associação Latinoamericana de Investigadores da Comunicação (ALAIC), César Bolaño nos falou sobre a volta da EPC para os eventos da Sociedade Brasileira de Ciências da Comunicação (Intercom) e também explica informações essenciais para o desenvolvimento desta linha teórica aqui no Brasil.



Cepcom-Comulti - Professor Bolaño, como está localizado o estudo da Economia Política da Comunicação nas Ciências da Comunicação do Brasil? E o que a distingue dos outros estudos da área?
César Bolaño – Bom, a Economia Política da Comunicação é um sub-campo da comunicação. Agora é um sub-campo que tem determinadas especificidades, um diálogo muito próximo com o materialismo histórico e um caráter muito interdisciplinar e nesse sentido nós consideramos como um programa de pesquisa, no sentido para evitar a palavra paradigma, um programa de pesquisa geral para o campo da comunicação. Não exclusivo, evidentemente, mas, do ponto de vista epistemológico, um diálogo onde é possível discutir todas questões da comunicação a partir desse ponto de vista.

CC – Qual é ou quais são o principal ou principais objetos de estudo da Economia Política da Comunicação?
CB – O objeto de estudo da Economia Política da Comunicação é a comunicação, é os meios e as mediações, para usar os termos do Martin Barbero que todo mundo conhece. A Economia Política da Comunicação discute meios e mediações. Discute a comunicação de um modo geral, não apenas a mídia, não apenas os processos de concentração, que é o que a economia política europeia, americana, faz mais; não apenas a denúncia dos processos de poder e de concentração nos meios de comunicação, que nós também fazemos, mas a comunicação interpessoal, as relações de mediação nisso, agora sempre na perspectiva das estruturas de poder, de macropoder e de micropoder, e das relações de classe.
CC – Por essa perspectiva, de que forma se dialoga o avanço tecnológico e com a democratização da comunicação?
CB – Com o avanço tecnológico, uma perspectiva muito crítica, não é, de entender, por exemplo, a internet, os novos meios de comunicação como elementos que carregam possibilidades importantes de democratização, mas que na sua essência são mecanismos de controle social e de acumulação de capital. Então, justamente a característica da economia política que é entender esse objeto, por exemplo, e todos os outros objetos numa perspectiva dialética e crítica. Não há ufanismo e nem uma visão negativa e impotente diante dos fatos. A questão é entender quais são as contradições e, portanto, quais são as possibilidades de mudança que estão postas para os atores sociais num determinado momento.
CC - Quem trabalha com a EPC hoje no Brasil?
CB – Quem trabalha com a EPC hoje no Brasil é um grupo relativamente grande neste momento, quer dizer, pode dizer que é um grupo grande pequeno, porque é pequeno quando comparado a áreas disciplinares, como Jornalismo, Publicidade, que tem cursos, mas, portanto, é pequeno porque é um grupo transdisciplinar que pega um paradigma teórico para desenvolver, em seus diferentes textos, mas é grande no sentido que tem uma história já de... Só para dar um exemplo do site Eptic, do portal Eptic, da revista Eptic Online, mais de dez anos de produção ininterrupta, com muita produção e diferentes grupos. Você tem esse grupo aqui da Intercom, tinha o grupo que se organizava na Compós, que agora não tá funcionando, você tem núcleos em diferentes universidades, como em Sergipe, no Rio Grande do Sul, no Rio de Janeiro, vários grupos que se organizam em torno disso... Em cada lugar você pode ter grupos relativamente pequenos e muito ativos e que tem uma federação internacional, como é a Ulepicc, que tem um capítulo nacional muito ativo. A internacional já vai para o seu sétimo congresso bi-anual. A nacional já vai para o seu terceiro congresso. Quer dizer, é um grupo bastante dinâmico e que tem muita gente trabalhando, eu não quero citar nomes.
CC – Claro. Agora sobre o Intercom. De que modo você avalia o trabalho da EPC aqui no congresso nacional, em especial no minicurso, que é uma das novidades do Congresso esse ano?
CB – Olha, a Economia Política da Comunicação no Brasil ela surgiu dentro da Intercom há muitos anos atrás. Quando surgiram os primeiros grupos da Intercom, o grupo da Economia Política surgiu ali e tem uma longa trajetória nesse campo. No ano 2000, nós realizamos um último encontro e depois esse grupo foi encerrado, mas a Economia Política da Comunicação cresceu muito e de alguns anos pra cá, graças ao empenho e à generosidade do professor José Marques de Mello, nós retornamos através do Fórum Eptic, recriamos o grupo, o grupo já tá funcionando esse ano pela segunda vez e este ano nós resolvemos oferecer também um minicurso para os estudantes. A experiência foi muito boa. Então eu acho que a nossa relação com a Intercom é histórica, houve um pequeno interregno porque a política é assim, mas nesse momento a gente agradece muito à atual diretoria da Intercom e não posso deixar de citar sempre o professor José Marques de Mello, que foi quem nos apoiou mais nesse momento.

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