A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Ellen Gracie negou o andamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO nº9) movida pela Federação dos Radialistas (Fitert) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). A Ação foi ajuizada na quarta-feira (20) e arquivada na quinta (21). As organizações sindicais, com o auxílio do professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e jurista Fábio Konder Comparato, pediam que a Justiça declarasse omissão inconstitucional do Congresso Nacional em legislar sobre algumas leis da Constituição sobre comunicação que não foram regulamentadas, como os artigos 220 e 221.
Se a reivindicação da Fitert e da Fenaj for aceita pelo STF, o Congresso terá que providenciar a regulamentação dos artigos constitucionais em regime de urgência. No entanto, a ministra Ellen Gracie, relatora da ADO 9, entendeu que as entidades sindicais não tinham legitimidade para serem as proponentes da Ação. “No âmbito das associações sindicais, apenas estão aptas a deflagrar o controle concentrado de constitucionalidade as entidades de terceiro grau, ou seja, as confederações sindicais, excluindo-se, portanto, os sindicatos e as federações, ainda que possuam abrangência nacional”, disse ela, em notícia publicada no site do Supremo.
A batalha, porém, não está perdida. O jurista Fábio Comparato criticou a decisão monocrática da ministra Ellen Gracie. Ele afirmou que vai entrar com um agravo regimental no STF nesta terça-feira (26). Trata-se de um recurso judicial que pede que a decisão sobre a questão seja tomada pelo conjunto dos ministros do Supremo. Se o colegiado tiver o mesmo entendimento que Ellen Gracie, Comparato deve apresentar a Ação novamente por meio de uma confederação sindical. Até o momento, portanto, o mérito da ADO 9 sequer foi analisado.
Regulamentação da Constituição
A Ação proposta pela Fitert e Fenaj centra seu pedido em três pontos. O primeiro questiona a omissão legislativa quanto ao direito de resposta. Tal dispositivo existe na Constituição, mas a sua regulação foi extinta junto com a Lei de Imprensa (Lei n° 5.250, de 9 de fevereiro de 1967) pelo próprio STF em 19 de abril de 2009. Com isso, a aplicação prática desse direito ficou prejudicada pela falta de parâmetros.
“Se, por exemplo, o jornal ou periódico publica a resposta do ofendido em caracteres bem menores que os da matéria considerada ofensiva, ou em seção diversa daquela em que apareceu a notícia a ser retificada, terá sido dado cumprimento ao preceito constitucional? Analogamente, quando a ofensa à honra individual, ou a notícia errônea, são divulgadas por emissora de rádio ou televisão, caso a transmissão da resposta ou da retificação do ofendido for feita em outra emissora da mesma cadeia de rádio ou televisão, ou em programa e horário diversos da transmissão ofensiva ou errônea, terá sido cumprido o dever fundamental de resposta?”, questiona a Ação.
O texto da ADO também lembra, ainda sobre esse ponto, que até hoje não existe uma legislação específica que regule o direito de resposta quando a ofensa ou a informação equivocada for divulgada pela internet. “Quando muito, a Justiça Eleitoral procura, bem ou mal, remediar essa tremenda lacuna com a utilização dos parcos meios legais de bordo à sua disposição”, esclarece a ADO.
A segunda questão levantada pelas entidades sindicais é a falta de regulamentação dos princípios dispostos no art. 221 da Constituição Federal. O citado artigo define que a preferência das programações deve servir à finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; que deve promover a cultura nacional e regional, estimulando a produção independente; que deve assegurar a regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; e que respeite os valores éticos e sociais da pessoas e da família.
No entanto, todo o artigo está prejudicado pela falta de regulação e também de uma ação fiscalizatória mais ativa por parte do Ministério das Comunicações (Minicom). Para ficar apenas no problema da falta de regionalização, vale citar um estudo realizado por este Observatório a partir da análise de 58 emissoras em onze capitais das cinco regiões do país. Ele demonstrou que apenas 10,8% do tempo veiculado é ocupado com conteúdos de origem local. O índice é bastante inferior ao percentual de 30% previsto no Projeto de Lei nº 256/1991 da então deputada – eleita novamente este ano - Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que visa regulamentar o dispositivo constitucional citado acima, tramitando no Congresso Nacional há 19 anos.
Conheça a pesquisa “Produção Regional na TV Aberta Brasileira”.
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Sobre o assunto, a ADO diz: “Nem se argumente, para contestar a ocorrência dessa omissão legislativa inconstitucional, com a permanência em vigor do Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei n° 4.117, de 27 de agosto de 1962), promulgado antes do advento do regime militar de exceção. A rigor, a única disposição desse Código, pertinente aos princípios enunciados no art. 221 da Constituição Federal, é a do seu art. 38, alinea h, a qual determina deverem as emissoras de rádio e televisão destinar um mínimo de 5% (cinco por cento) de seu tempo para transmissão de serviço noticioso; sem qualquer referência às transmissões com finalidades educativas, culturais ou artísticas.”
A omissão legislativa em regular a proibição de monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação social é o terceiro ponto da Ação ajuizada por Comparato em conjunto com as entidades sindicais. Apesar de estar presente no artigo 220 da Constituição, tal medida não é regulamentada e tampouco auto-aplicada no país.
A definição legal que existe sobre o assunto é um Decreto-Lei 236 de 1967, que estabelece os limites referentes às outorgas que podem ser obtidas por uma “entidade”. Em nível regional, tal restrição é de quatro estações de Ondas Médias e seis de FM. Em nível nacional cada ente só pode operar até duas estações de Onda Curtas e de Ondas Médias e até dez emissoras de TV, sendo no máximo cinco em VHF e duas por estado. No entanto, vários grupos burlam tal decreto, usando pessoas jurídicas diferentes, mas que pertecem aos mesmos grupos econômicos e políticos para conseguir as concessões.
A Ação também cita um caso norte-americano para exemplificar como a regulação é importante para frear a tendência monopolista do mercado capitalista. Ela lembra que em 1966, no auge da pressão desregulamentadora do movimento neoliberal, o Congresso dos Estados Unidos votou o Telecommunications Act, que eliminou a maior parte das restrições à formação de grupos de controle no setor de comunicações de massa, estabelecidas por uma lei anterior, de 1934.
“O resultado não se fez esperar: enquanto em 1983 existiam nos Estados Unidos 50 grupos de comunicação social, menos de 10 anos após a edição do Telecommunications Act de 1996 o mercado norte-americano do setor passou a ser dominado por 5 macroconglomerados de comunicação de massa; os quais diferem entre si unicamente pelo estilo das publicações e transmissões, pois o conteúdo das mensagens divulgadas é exatamente o mesmo”, relata a ADO.
Motivações
O coordenador da Fitert, Nascimento Silva, explica que um dos motivos para a Ação é a dificuldade que a sociedade tem encontrado de fazer com que o legislativo crie e regulamente leis para a área da comunicação em defesa do interesse público. Ele lembra, por exemplo, que tanto a Câmara quanto o Senado pouco fizeram para dar encaminhamentos as mais de 600 propostas aprovadas na Conferência Nacional de Comunicação, que ocorreu no fim de 2009.
Apesar de este recurso judicial escolhido pelas entidades sindicais ter poucos precedentes no país, o jurista Fábio Comparato acredita ser essencial que o Estado tenha uma atuação mais forte no setor. “Essa conversa fiada de excesso regulamentar, no setor, é típica da mentalidade capitalista. Até a velhinha de Taubaté sabia que o mercado só é livre quando o abuso de poder é impedido por adequadas disposições legais e administrativas. Sem isto, prevalece necessariamente a lei do mais forte, ou melhor, do que tem menos escrúpulos”, arremata.
Apesar de este recurso judicial escolhido pelas entidades sindicais ter poucos precedentes no país, o jurista Fábio Comparato acredita ser essencial que o Estado tenha uma atuação mais forte no setor. “Essa conversa fiada de excesso regulamentar, no setor, é típica da mentalidade capitalista. Até a velhinha de Taubaté sabia que o mercado só é livre quando o abuso de poder é impedido por adequadas disposições legais e administrativas. Sem isto, prevalece necessariamente a lei do mais forte, ou melhor, do que tem menos escrúpulos”, arremata.
Fonte: Observatório do Direito à Comunicação (Jacson Segundo)
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